Dois ou três milímetros de meus dedos do pé tinham abaixo de si apenas um incomensurável vazio, o suficiente para me passar a impressão de que eu cairia a qualquer instante. Meu tronco inclinado para a frente e meu pescoço curvado suspendiam minha cabeça sobre o infinito nada.
Uma gota de suor escorreu até a ponta do meu nariz e, como se tomasse coragem, hesitou alguns segundos e caiu. Tenho a impressão de que ela nunca tocou o chão. O abismo da loucura, diferentemente de todos os outros, não tem fim. Outros abismos, por mais profundos e escuros que sejam, punem aqueles que neles se atiram com o choque contra seu fim. O abismo que me seduzia amaldiçoar-me-ia com um indefinido cair. Em qualquer outro abismo eu me atiraria num momento de furor e morreria neste mesmo momento, ou, em abismos mais profundos, encontraria meu fim num intervalo de estupor diante da inevitável morte.
Mas no abismo da loucura pula-se num surto e cai… cai indefinidamente, tempo suficiente para recobrar a razão e se arrepender. Por mais reparável que tenha sido o ato aos outros, para quem pula, não há reparação. Mesmo tendo soltado o pescoço da garota antes que ela soltasse seu último e obstruido suspiro, mesmo tendo largado as armas e se entregado sem ferir um inocente sequer, aí já se terá passado do ponto sem retorno. Não é preciso que se conclua qualquer ato hediondo, começá-lo já é efetivamente surtar, é pular no abismo sem fim, e cair eternamente sob o embasbacado olhar alheio, sob as perguntas irrelevantes de psiquiatras que creem saber mais sobre o louco do que este sabe sobre si próprio e teimam em buscar o mal onde o mal não está.
E o abismo tão profundo, se é que se pode chamar de profundo um abismo sem fundo, me seduzia, mas eu sabia que eram poucas minhas chances de me encontrar com uma saliencia de sua parede na longa queda em direção a coisa alguma antes de recobrar a razão e, assim, livrar-me da penúria de somente cair, absolutamente incerto.
E assim levantei minha cabeça, mas ainda com os olhos baixos, fitando, mais discretamente agora, aquele que me seduzia. Dei alguns desajeitados passos para trás, sem conseguir me livrar daquela troca de olhares. Virei e prossegui, passo a passo, cada um muito bem pensado. Tenho medo de correr sem pensar, tenho medo de, no calor da fuga, por qualquer motivo serm razão, virar-me mais uma vez para o abismo e correr em sua direção e saltar, tudo muito rápido, também sem pensar.
Uma gota de suor escorreu até a ponta do meu nariz e, como se tomasse coragem, hesitou alguns segundos e caiu. Tenho a impressão de que ela nunca tocou o chão. O abismo da loucura, diferentemente de todos os outros, não tem fim. Outros abismos, por mais profundos e escuros que sejam, punem aqueles que neles se atiram com o choque contra seu fim. O abismo que me seduzia amaldiçoar-me-ia com um indefinido cair. Em qualquer outro abismo eu me atiraria num momento de furor e morreria neste mesmo momento, ou, em abismos mais profundos, encontraria meu fim num intervalo de estupor diante da inevitável morte.
Mas no abismo da loucura pula-se num surto e cai… cai indefinidamente, tempo suficiente para recobrar a razão e se arrepender. Por mais reparável que tenha sido o ato aos outros, para quem pula, não há reparação. Mesmo tendo soltado o pescoço da garota antes que ela soltasse seu último e obstruido suspiro, mesmo tendo largado as armas e se entregado sem ferir um inocente sequer, aí já se terá passado do ponto sem retorno. Não é preciso que se conclua qualquer ato hediondo, começá-lo já é efetivamente surtar, é pular no abismo sem fim, e cair eternamente sob o embasbacado olhar alheio, sob as perguntas irrelevantes de psiquiatras que creem saber mais sobre o louco do que este sabe sobre si próprio e teimam em buscar o mal onde o mal não está.
E o abismo tão profundo, se é que se pode chamar de profundo um abismo sem fundo, me seduzia, mas eu sabia que eram poucas minhas chances de me encontrar com uma saliencia de sua parede na longa queda em direção a coisa alguma antes de recobrar a razão e, assim, livrar-me da penúria de somente cair, absolutamente incerto.
E assim levantei minha cabeça, mas ainda com os olhos baixos, fitando, mais discretamente agora, aquele que me seduzia. Dei alguns desajeitados passos para trás, sem conseguir me livrar daquela troca de olhares. Virei e prossegui, passo a passo, cada um muito bem pensado. Tenho medo de correr sem pensar, tenho medo de, no calor da fuga, por qualquer motivo serm razão, virar-me mais uma vez para o abismo e correr em sua direção e saltar, tudo muito rápido, também sem pensar.
1 Comments:
Um dos textos mais tensos que já li. Boa Harry
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